Especial de aniversário da Três Pontos #4

E agora, o que vem por aí?

Capa da newsletter, com o título: "Muito além do ponto final… especial de aniversário 4.

Eu não sei falar de futuro.

Quando era mais nova, não tinha uma profissão dos sonhos, nem uma faculdade que queria muito cursar. Nunca tive sonho de ter uma família, morar em algum lugar específico. Na parte de religião, sempre fui mais de agradecer do que de pedir. Nunca quis nem saber do futuro nos búzios que minha família tem o costume de jogar. Fazer planos de curto, médio e longo prazo em exercícios de trabalho/faculdade sempre foi um suplício.

E aqui estou, escrevendo um texto sobre “o que vem por aí”.

Não ajuda em nada esse mercado ser construído em cima de notícias que eu só posso tornar públicas talvez quem sabe alguns meses (às vezes anos) depois dos contratos serem fechados. Posso até dizer que vem aí um quadrinho num selo infantil que vai ser anunciado na primeira quinzena de maio. Posso avisar que vem aí um relançamento pelo qual eu tô empolgada demais e já já vai ser anunciado também. Posso ser vaga, falar sobre outros formatos e deixar escapar que vêm audiobooks (no plural mesmo) por aí muito em breve. Posso falar também que tem um monte de coisas rolando das quais ainda não posso falar.

Mas mesmo que essas sejam notícias do que “vem aí” para o público, quando eu paro pra planejar o futuro da agência internamente, elas meio que já estão no passado ou, no máximo, no presente, daí eu caio aqui num tempo indefinido, nem lá, nem cá, planejando um futuro que já aconteceu.

Não coloco metas de faturamento pra agência, já que dependo de fatores sobre os quais não tenho nenhum controle, como as pessoas escolherem comprar os livros dos autores que eu represento ou as editoras resolverem comprar um original que estou representando. Posso fazer uma média, ter uma expectativa conservadora (e é isso que eu faço pra não pirar em relação a dinheiro), mas nada garantido. Isso me impede de firmar metas de expansão que dependam de dinheiro (contratar outras pessoas, aumentar salários), já que eu vivo basicamente de seis em seis meses, recalculando as rotas financeiras em março e setembro, quando o grosso dos pagamentos de direitos autorais cai. Basicamente meu plano de futuro é trabalhar pura e simplesmente acreditando que vai dar certo, e metas são coisas exatas e rígidas demais pra firmar, são compromissos assumidos e que têm que ser cumpridos.

Só que uma coisa que eu tenho aprendido na minha vida pessoal é que planos têm também um pouco de sonho, que objetivos têm um pouco de desejo. E que pra conseguir fazer planos e ter objetivos, a gente precisa se permitir se colocar como prioridade.

Eu disse aqui na primeira newsletter de aniversário que tenho muita dificuldade pra reconhecer publicamente as coisas boas que eu faço, pelo perigo de soar arrogante ou das pessoas pensarem que eu acho que estou inventando a roda por fazer algo que já tá sendo feito aí há tempos (e em geral não sou arrogante, muito menos acho que estou inventando qualquer coisa), e isso também se estende a ter dificuldade pra fazer planos porque eu tenho dificuldade de querer coisas. E de reconhecer e admitir que as quero. Publicamente, então, nem se fala.

Porque querer é se admitir vulnerável, desejar é abrir mão do controle. Fazer planos baseados em vontade e sonho significa que eles podem não dar certo. E “falhar” é assustador pra cacete.

Só que eu quero coisas pra Três Pontos. Eu quero representar autores com projetos diferentes do que fiz até agora (tô trabalhando no primeiro projeto de não ficção da agência), quero trazer discussões de temas relevantes e difíceis pra literatura (uma hq sobre aborto tá em desenvolvimento), quero poder aumentar o valor que pago hoje pros colaboradores da agência, quero ser uma gestora melhor (e tô trabalhando nisso junto com a equipe), quero que a agência ajude a promover mudanças importantes nesse mercado, quero sentir de novo a felicidade de ter autores indicados a (e ganhando!) prêmios, quero que os projetos audiovisuais continuem a andar pra eu morrer de chorar ao ver um livro no qual eu trabalhei interpretado por pessoas de verdade numa tela (pequena ou grande), quero que certos projetos deem certo pra eu surtar por estar ligada a uma marca que acompanhou boa parte da minha infância, quero ver livros que eu represento continuarem sendo adotados e discutidos em escolas, quero crescer a equipe da agência, quero (ter tempo pra) encontrar novas vozes, quero aprender a mostrar o que estou fazendo sem ter vergonha de aparecer, quero mais publicações internacionais de livros feitos no Brasil, quero que os autores possam se orgulhar de serem representados por mim e pela Três Pontos, quero todo dia sentir um fascínio e uma incredulidade pelas conquistas dos autores da agência, quero querer mais coisas e quero alcançar essas coisas.

Podem não ser planos estruturados, nem metas quadradinhas, podem ser coisas que dependem muito de outras pessoas, mas essas vontades ditam a direção das minhas ações e, a partir delas, consigo ver uma estrada pela qual seguir, mesmo que dando um passo de cada vez. Ela pode dar em um milhão de lugares diferentes, posso pegar algum caminho errado e ter que voltar, mas acredito que no final eu vou estar em um lugar onde quis chegar. Mesmo sem saber se de fato existe algum final no qual chegar.

Eu continuo sem saber falar de futuro, mas tô aprendendo a desejar um.

Cena de Lua de Cristal, file da Xuxa. Ela olha para cima e grita "lua de cristal!".. Xuxa é loira, branca e usa um vestido branco.

Oi, Tassi aqui ainda!

Queria te agradecer por passar esse mês lendo meus textos aqui na newsletter. Ser um CNPJ e um CPF ao mesmo tempo é sempre complicado, e poder externalizar algumas das questões com as quais me preocupo em ambos é importante, mesmo que seja difícil.

Ainda quero falar sobre remuneração de autores e dinheiro em geral, compartilhar um pouco do processo de escrita dos autores, entre outros assuntos e notícias que vão continuar rolando aqui na newsletter, mas a partir de agora passo a bola pra Gih (Alves, da comunicação, que também é autora e tem livro saindo pela Seguinte esse ano!).

Queria aproveitar essa última edição especial de aniversário pra deixar bem aberto esse canal de comunicação e dizer que sugestões sobre temas e discussões de mercado são sempre bem vindas por aqui e pelas redes da agência! E também pra avisar que a Diana Passy vai começar uma newsletter pra responder dúvidas sobre o mercado editorial, então aproveitem pra mandar sugestões pra ela também.

Mais uma vez, muito obrigada por fazer parte da história da Três Pontos. Espero que você continue com a gente por muito tempo <3